Proximidade entre continentes

Há 16 anos no Brasil, Liu, Chiu Chih, mostra integração com os costumes ocidentais

Liu, Chiu Chih escolheu o nome Jessica para facilitar o contato com os brasileiros, já que seu nome é difícil de pronunciar. Chinesa de Taiwan, ela diz que o país onde morava é bastante avançado, diferente do resto da China, e se parece em muitas coisas com o Brasil. É capitalista e tem hábitos semelhantes aos ocidentais.

A chinesa diz que não tem um grande apego à culinária típica e que gosta muito da comida brasileira, embora mantenha a tradição de fazer alguns pratos orientais. As filhas, nascidas no Brasil, são fluentes em mandarim, que é a língua oficial falada em casa.

Professora do idioma, Jessica admite que no início, assim como os seus alunos, também pensava que aprender o mandarim era muito difícil. Mas, com o tempo entendeu que não é mais difícil do que outras línguas, só é preciso saber como ensinar. “Mesmo o inglês leva tempo para se aprender, o aluno precisa se dedicar, fazer cursos, intercâmbio. Se um estudante disponibilizar para o mandarim o mesmo tempo que dedica para o inglês, também vai ficar fluente. Tenho alunos que estudam cinco anos e falam muito bem”, conta.

A maior dificuldade na sua adaptação ao Brasil foi ter que conviver com crianças morando nas ruas e ver como os idosos são tratados. “Isso eu não acostumo”, destaca.

Jessica fala que uma importante diferença entre a China e o Brasil, é que na China tudo o que é público tem mais qualidade do que o que é particular, a começar pela educação e a saúde. “Os melhores colégios são públicos, então todos têm igualdade de condições. Nas famílias pobres as crianças, costumam se esforçar ainda mais, estudar ainda mais, para mudar a situação da pobreza. A moral ética dos chineses é mais rígida, mais correta. Mesmo que sejam pobres cuidam dos filhos. Eu sempre recebi um ensinamento: eu posso ser pobre de falta de dinheiro, mas não vou ser pobre de caráter”, afirma.

Como era sua vida antes de vir para o Brasil?

Jessica – Eu era advogada e gostava de viajar. Um dia viajei para o Brasil, conheci, gostei e tive vontade de ficar. Então conversei com o meu marido e pouco a pouco, resolvemos vir morar aqui, isso já faz 16 anos. O primeiro lugar no Brasil onde moramos foi Foz do Iguaçu, ficamos lá durante quatro anos, tínhamos amigos na região. Com o tempo fui conhecendo mais o país e gostei muito do Rio Grande do Sul, muitos dos amigos que eu tinha no Paraná eram gaúchos. Então, em 2000, compramos essa casa e viemos morar em São Leopoldo.

Por que você decidiu sair do seu país para morar no Brasil?

Jessica – Quando resolvi deixar Taiwan para vir para o Brasil eu tinha 31 anos e um trabalho fixo, era concursada. E concurso é como uma tigela de ferro, dali para frente a vida parece só isso, sempre igual, e a gente queria tentar coisas diferentes.

Quando você resolveu dar aulas de mandarim?

Jessica – Quando eu cheguei aqui eu pensei no que poderia trabalhar. As opções mais comuns seriam abrir uma loja ou um restaurante, mas não gosto muito da parte culinária e não tinha vontade de trabalhar no comércio. Desde que cheguei no Brasil comecei a dar aulas, primeiro em uma escola que tinha parceria com o governo de Taiwan, em Cidade Del Leste, depois quando nos mudamos para o Rio Grande do Sul passei a dar aulas para filhos de chineses, em Porto Alegre. No entanto percebi que os pais desejavam que os filhos aprendessem mandarim, mas essa não era uma vontade dos estudantes. Resolvi então que queria ensinar brasileiros que estivessem interessados em estudar a cultura da China e aprender a falar mandarim.

“Mesmo o inglês leva tempo para se aprender, o aluno precisa se dedicar, fazer cursos, intercâmbio. Se um estudante disponibilizar para o mandarim o mesmo tempo que dedica para o inglês, também vai ficar fluente. Tenho alunos que estudam cinco anos e falam muito bem.”

Jéssica, professora do Unilínguas

Então, preparei, junto com o meu marido, um projeto para ensinar a minha língua nas universidades, visitei várias instituições para propor o curso e divulgar a língua chinesa. Num primeiro momento não havia procura do mandarim, as pessoas não estavam interessadas em aprender. Em 2003 ou 2004, o Unilínguas nos ligou dizendo que tinham interesse em propor um curso de mandarim. No início a procura foi grande, havia muita curiosidade em torno das diferenças culturais, depois o número de alunos diminuiu em função da dificuldade de aprender a língua. Hoje a procura tem aumentado. Acredito que a tendência agora é só aumentar, em função dos negócios entre brasileiros e chineses.

O que você mais gosta no Brasil e o que mais sente falta do seu país?

Jessica – O que eu mais gosto é que os brasileiros são muito simpáticos, eu viajei para muitos países, mas o Brasil tem um coração muito grande, aceita, verdadeiramente, os imigrantes, Brasil é como um coração de mãe. Os brasileiros se sentem um pouco imigrantes, por isso aceitam muito bem que vem de fora. Além disso, respeitam mais o meio ambiente, muito diferente da China. Aqui vocês priorizam o ambiente, lá a gente prioriza a comida, tem muitos restaurantes, bem mais do que no Brasil. A comida chinesa é mais gostosa, só que a brasileira é mais saudável e mais prática, leva menos tempo para preparar, só que tem muito sal e muito açúcar, isso tem que diminuir. Lá tem mais segurança, isso eu sinto falta. Lá tem menos grades, menos muros, menos roubo e assalto. Podemos deixar as casas abertas até tarde da noite e podemos andar pelas ruas em qualquer horário sem ter medo.

Qual a maior dificuldade que você sentiu na adaptação em um país com outro idioma?

Jessica – Nunca me dediquei muito para aprender o português. Ainda tenho dificuldade na conjugação dos verbos, principalmente para escrever. Mas assim que cheguei ao Brasil assisti filmes em português, li livros e fiz algumas aulas particulares de português, o que me ajudou na adaptação ao novo idioma.

Você costuma visitar o seu país? Pretende retornar, ou ficar morando no Brasil?

Jessica – Sim. Já fui visitar minha família várias vezes e meus sogros também já vieram duas vezes nos visitar, e gostaram, acharam o ar mais limpo, a água mais gostosa, o céu mais azul e tudo mais espaço.

Quais aspectos culturais são primordiais quando se aprende uma nova língua?

Jessica – A língua chinesa está diretamente ligada à cultura da China. O mais importante, no meu ponto de vista, é a moral e a ética dos chineses. Trazer para os alunos a valorização do idoso, que para os orientais é fundamental. Apresentar essas diferenças culturais, que podem contribuir para a vida dos estudantes. Eu passo para eles os ensinamentos, se acham certo, podem levar para suas vidas.

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