Estudante da Unisinos lança livro que preserva memórias de escola destruída pelas enchentes de 2024 no RS 

Crédito: Arquivo pessoal

A tragédia das enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em maio de 2024 devastou comunidades inteiras e marcou profundamente a vida de milhares de pessoas. Entre as histórias que emergem desse cenário de perdas e reconstrução, está a da Escola Estadual de Ensino Médio Mariante, localizada em Venâncio Aires, que teve sua estrutura destruída pela água. Para impedir que a memória desse espaço se perdesse, a professora e doutoranda em Educação pela Unisinos, Rafaela Limberger, idealizou e organizou um livro que registra as lembranças, vivências e afetos de quem fez parte da trajetória da escola. 

Crédito: Arquivo pessoal

A ideia do livro nasceu de uma dor pessoal e coletiva. Rafaela atuava como docente na escola e acompanhou de perto a destruição do espaço e o impacto sobre a comunidade local. “O que meus olhos viram nos dias que se seguiram foi uma tristeza imensurável pela perda de uma escola onde muitos estudaram ou trabalharam a vida inteira. A escola e a Vila Mariante são uma só”, relata. 

Ao lado de sete estudantes que haviam perdido tudo nas enchentes — muitos saíram apenas com a roupa do corpo —, Rafaela decidiu transformar o luto em ação. “Para mim, naquele momento, não havia conteúdo disciplinar capaz de lidar com o que estávamos sentindo. Propus que fizéssemos um livro contando a história da nossa escola. Quando me perguntaram como faríamos isso, já que a água tinha levado tudo, respondi: ‘Tudo, menos as nossas memórias’”, lembra. 

Crédito: Arquivo pessoal

Com base em entrevistas e relatos orais, a equipe reuniu depoimentos de ex-alunos, professores e moradores da comunidade, construindo um retrato coletivo da importância da escola para a região. 

O processo de produção foi permeado por desafios emocionais e práticos. “O mais difícil foi lidar com a dor — a minha, a dos meus estudantes e a dos entrevistados. Era um luto coletivo, que atravessava não só nossa comunidade escolar, mas todo o estado”, conta Rafaela. 

Além do aspecto emocional, a viabilização financeira também exigiu esforço. A professora se envolveu com a elaboração de um projeto cultural e conseguiu aprová-lo em um edital, garantindo recursos para a impressão da obra.  

A obra contou com a colaboração de pesquisadores, professores e estudantes, entre eles nomes ligados ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos. Participaram da escrita: 

Luciane Sgarbi Grazziotin, Alexandre Ferraz da Conceição, Maria Luiza Adoryan Machado, Gabriele Milena Junges, Larisa da Veiga Vieira Bandeira, Luciane Bresciani Lopes, Kauã Lucas Drunn, Gabriela Schwengber, Marcos Hinterholz, Fabiano Júnior Reckziegel da Conceição, Tainá Martins de Barros, Letícia da Silva, Thauan de Paula Fonseca, Camila da Rosa, Carlos Gilberto Pereira Dias, Carine Menna Barreto, Rafaela Limberger, Luana Eduarda Schmitt da Silva, Lucas Costa Grimaldi, Ricardo Figueiró Cruz, Igor Ivan Pacheco de Araújo, Eduardo Cristiano Hass da Silva, Marisa Fernanda da Silva Bueno, Eduardo Brandão da Rosa, Rosane Sasset e Helen da Silva Silveira. 

O projeto ultrapassou os limites da sala de aula e se transformou em uma experiência transformadora para Rafaela e para todos os envolvidos. “Este livro mudou a minha vida. Ele reafirmou o tipo de profissional que eu sou: uma professora que escuta seus estudantes e os respeita. A ciência só faz sentido se puder transformar vidas, e esse projeto é um exemplo disso”, afirma. 

A obra também projetou novos caminhos profissionais para a doutoranda, que foi convidada a dar entrevistas em jornais, participar de programas de rádio e realizar formações para educadores. “Fui recebida pela Secretária de Estado do Rio Grande do Sul para entregar um exemplar e participarei, em novembro, de um evento acadêmico na Universidade de Santa Cruz do Sul. Esse projeto abriu portas até mesmo para a produção de um minidocumentário”, conta. 

O livro é apenas o início. Em novembro, será lançado um minidocumentário sobre o processo de criação da obra e as memórias da comunidade. Para 2026, Rafaela planeja captar recursos para uma exposição itinerante em escolas atingidas pelas enchentes e produzir um documentário mais amplo. 

Paralelamente, ela segue com seu doutorado sanduíche na Universidade de Valladolid, na Espanha, e planeja seguir carreira acadêmica como docente universitária, articulando ciência e comunidade. 

Crédito: Arquivo pessoal

Mais do que narrar a história de uma escola do interior gaúcho, o livro destaca o poder dos relatos orais e da memória coletiva diante da destruição. “Sem memória, não há identidade. Este livro nasceu do compromisso com a preservação histórica e do reconhecimento de que a memória é um patrimônio imaterial que precisa ser protegido”, ressalta Rafaela. 

A obra também contribui para o enfrentamento dos impactos psicológicos e sociais causados pelas enchentes. “Ela ajuda a processar coletivamente a dor e a construir novas formas de pertencimento e ressignificação”, conclui. 

O livro está disponível aqui

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