Encontro com fotojornalista Fernando Gomes

“Sou Colorado, mas se estou cobrindo o Grêmio, torço pra que o Grêmio ganhe porque quero a minha foto na capa do jornal”.

Foto: Kalita Ruama

Assim é Fernando Gomes: apaixonado pelo fotojornalismo. Ele esteve no último sábado (07/05) contando suas histórias fotográficas para os estudantes dos cursos de Fotografia e Jornalismo, da Unisinos, na atividade Encontro com o Autor.

Fernando é protagonista de muitas histórias. Contou e mostrou fotos, desde o telefoto, equipamento rústico utilizado por ele no final da década de 1970 e praticamente em toda a década de 1980, quando o fotógrafo levava cerca de meia hora para transmitir uma única foto do lugar de um acontecimento jornalístico até a redação do jornal.

Com a tranquilidade de quem possui quase 40 anos de fotojornalismo, três décadas só no jornal Zero Hora, onde trabalha atualmente, Fernando deu boas dicas para quem quer começar no fotojornalismo: “Para desenvolver o faro, o bom é cobrir futebol”, disse. E destacou que, com a prática de futebol que adquiriu, chegou num nível de intimidade com o evento que consegue sempre antever o que irá ocorrer com os jogadores em campo.

Outra orientação do repórter-fotográfico diz respeito ao fato de que, para ser bom na área, deve-se estar sempre muito bem informado, conhecer as pessoas que se vai fotografar, ou pelo menos ter o máximo de conhecimento acerca do contexto da notícia. E outra: “Nunca joguem foto fora, pensando que não serve para a pauta que estão cobrindo”.

Foto: Fernando Gomes

Entre as tantas histórias que o fotógrafo cobriu, figuram as suas preferidas, como a ocorrida no ano de 1984, quando um casal e seus três filhos ficaram suspensos dentro de um fusca, em uma ponte que se rompeu com a enchente que elevou as águas do Rio Toropi, próximo a Santa Maria (RS). Fernando Gomes fotografou a hard news a bordo de um helicóptero, no momento em que avistou um homem – que, depois, soube, era a pessoa que conduzia o fusca – tentando segurar com o corpo o próprio carro, que estava prestes a cair da ponte rachada ao meio pela enxurrada.

Com a imagem mais dramática do acontecimento, Fernando foi premiado e sua foto correu o mundo através de jornais internacionais, em um tempo em que a fotografia era com câmera de filmes, carregada com positivo (slides). “Fiz as fotos, ajudei a puxar o fusca e depois o pessoal me disse que eu havia ajudado para não dar tempo de o Correio do Povo chegar ao local”, brincou o fotógrafo, habituado com um tempo em que a concorrência no fotojornalismo era muito forte, um tempo em que não se saía da pauta por medo de se levar “furo”.

Foto: Fernando Gomes

Hoje estamos em outros tempos e a mudança é radical em trinta anos. Corroborada pela tecnologia, uma pauta recente colocou o fotógrafo a correr Osvaldo Aranha afora e se embrenhar pela Garibaldi atrás de um drone: “O drone resolveu fugir, e foi parar em cima de uma árvore, e lá fui eu subir na árvore para apanhar o danado”, contou. De um tempo de câmera 35mm com negativos em preto e branco, para um tempo em que, em uma única cobertura fotográfica, se tem que dar conta das fotos da pauta, do vídeo do acontecimento e, não raro, captar imagens em um drone (nele acoplado uma câmera Go-Pro com time lapse de uma foto por segundo). “Hoje, em poucos minutos a foto está na redação para “matar a fome do leão”, conta, referindo-se ao portal de notícias, primeira camada de acontecimento jornalístico da cultura digital, para onde se dirige qualquer foto que evidencie a notícia coberta.

Neste “pega e larga” um e outro dispositivo, perde-se muita oportunidade de se fotografar melhor, reclamou o fotógrafo. São outros tempos!

Com a desenvoltura típica de quem já passou várias vezes por todas as editorias de um jornal diário, o fotógrafo contou sobre as pautas tristes, desde mortes de crianças que teve que segurar o choro, ou simplesmente se deixar chorar até os tempos também muito tristes quando tinha que se deixar fotografar pelo pessoal do Exército ainda no tempo da ditadura militar: “Eles nos cuidavam o tempo todo. Éramos muito vigiados naquela época. Qualquer passo em falso e tu ias preso”, lembrou o repórter.

Foto: Fernando Gomes

Certa vez Fernando estava acamado por conta de uma fratura na perna e foi advertido por sua mulher de que estavam prendendo alguém na rua em frente de sua casa. Lá foi ele de bengala fazer a foto através da janela do banheiro. O mais impressionante, além do fato de que ele recebeu uma bolada pelo prêmio com a foto, feita de casa com a perna quebrada, é o fato de que ele só se deu conta do real sentido da imagem que produzira, depois que o pessoal que revelava o filme na Zero Hora chegou pra ele e perguntou se ele tinha visto a foto que fizera. “Eu não enxerguei o cachorro na hora que estava com a câmera no olho. Só depois que os laboratoristas revelaram meu material é que vieram me mostrar”, afirmou.

Foto: Kalita Ruama

Ao final da atividade acadêmica, Fernando interagiu de um jeito diferente com os estudantes acostumados a ver tantas fotos passando os dedos e os olhos pelas telas de todos os tamanhos: “Legal é botar na mão deles a foto impressa. É outra relação”, me cochichou.

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