O recomeço depois da enchente: formação em Jornalismo ajudou egressa a reconstruir sua empresa

Crédito: Rodrigo W. Blum

Nem toda carreira segue uma linha reta. Algumas se constroem em desvios, reinvenções e, às vezes, em recomeços impostos pela realidade. A trajetória de Pâmela Oliveira, formada em Jornalismo pela Unisinos e cofundadora do estúdio Monterraro, é um exemplo de como uma formação universitária sólida pode atravessar diferentes fases profissionais — inclusive fora do roteiro tradicional — e se tornar decisiva em momentos de ruptura. Para a egressa, essa descontinuidade veio ano passado, na forma de uma enchente que, em poucas horas, interrompeu tudo o que havia sido construído até então.

Natural de Canoas, Pâmela sempre teve interesse por comunicação, linguagem e construção de sentido. Mais do que um treinamento para atuar em redações, ela encontrou na formação em Jornalismo uma base ampla para observar o mundo, interpretar contextos e tomar decisões. “A Unisinos não me preparou para um cargo específico, mas para lidar com a complexidade do mundo real. Aprendi a observar, interpretar cenários e decidir mesmo em situações difíceis”, afirma.

Essa forma de pensar se mostrou fundamental anos depois, quando Pâmela fundou, ao lado do designer Antonio Crestani, a Monterraro, um estúdio criativo que transita entre design e arte e é conhecido pelo uso de materiais inusitados em suas peças, como casca de ovo, café e erva-mate. Enquanto Antonio transforma matéria e conceito em esculturas tridimensionais, Pâmela atua na construção das narrativas, no posicionamento da marca e na gestão do negócio, unindo comunicação, estratégia e sensibilidade estética.

Crédito: Rodrigo W. Blum

Formação como visão de mundo

Para Pâmela, a Unisinos teve papel central na construção da sua identidade profissional. “Foi onde aprendi a enxergar o trabalho como algo que dialoga com a sociedade. A universidade me deu repertório cultural, sensibilidade social e rigor intelectual”, destaca. Esse aprendizado ultrapassou o período da graduação e passou a orientar escolhas profissionais, critérios de trabalho e a forma como a Monterraro se posiciona no mercado.

Entre as experiências marcantes da faculdade, ela destaca o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Mais do que um desafio acadêmico, o projeto representou um exercício de autonomia e resolução de problemas. “O TCC encoraja o aluno a resolver problemas de forma proativa. Ter passado por essa etapa me deu mais consciência das minhas próprias habilidades, algo que levo comigo até hoje”, relembra.

A ruptura: quando não existe retorno ao normal

Em 2024, Pâmela atravessou um dos momentos mais difíceis da sua vida pessoal e profissional. As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul chegaram à casa e ao estúdio da egressa, deixando um rastro de mais de três metros de altura de água, barro e planos interrompidos. O impacto foi imediato: em questão de horas, máquinas, ferramentas, materiais e pedidos prontos para envio foram completamente perdidos.

“O mais difícil foi perceber que não existia um ‘voltar ao normal’”, conta. A perda não foi apenas material, mas também simbólica: tudo o que sustentava a rotina profissional deixou de existir. Sem previsibilidade ou segurança, foi preciso aceitar que a reinvenção não viria como um plano idealizado, mas como uma necessidade imediata.

Pensar, criar e comunicar como estratégia de sobrevivência

Dois meses após a enchente, finalmente de volta à sua casa, Pâmela e Antonio decidiram transformar o recomeço em algo concreto. Nascia ali a escultura de mesa Um n(ovo) dia, criada em madeira e casca de ovo, material assinatura da Monterraro. O objeto, em formato de ovo, símbolo universal de vida nova, tornou-se um emblema de aceitação do presente e esperança de um futuro possível.

Mais do que um produto, a peça foi pensada como um manifesto. A fragilidade da casca de ovo, unida em uma estrutura resistente, dialoga com a força do coletivo e com o processo de reconstrução do Rio Grande do Sul. “A Unisinos me deu base para estruturar o pensamento e transmitir ideias com clareza. Foi a partir disso que criei o conceito da peça e todo o seu plano de comunicação”, explica.

O impacto foi decisivo: a venda da escultura financiou a retomada do estúdio e reposicionou a marca no mercado. O salto na percepção de valor também se refletiu nos números: de peças vendidas entre R$ 149 e R$ 398 para esculturas de parede que hoje ultrapassam os R$ 3 mil.

Formação sólida para trajetórias não lineares

Ao olhar para trás, Pâmela reforça que sua formação em Jornalismo foi determinante justamente por não estar restrita a uma função específica. “Em momentos de crise, o que sustenta não é uma ferramenta, mas a capacidade de pensar, interpretar e comunicar”, afirma.

Para ela, recomeços não significam fracasso, mas reorganização. “Trajetórias profissionais não são linhas retas. Ter uma formação que ensina a ler o mundo com profundidade ajuda a atravessar esses momentos com mais consciência e menos paralisia”, conclui.

Em um período marcado por encerramentos e novos ciclos, a história de Pâmela Oliveira evidencia como o aprendizado construído na Unisinos ultrapassa o tempo da graduação e se manifesta de forma concreta quando é preciso recomeçar, especialmente quando não existe um caminho pronto a seguir.

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