Índice de mortalidade é menor em sociedades ativas

Tomar parte nos problemas da comunidade local faz as pessoas viverem mais

Embora não exista fórmula para a vida eterna, viver mais e melhor é possível, pelo menos no que concerne à ciência. Isso foi o que comprovou o professor Marcos Patussi durante o pós-doutorado cursado na Harvard School of Public Health, nos Estados Unidos. O pesquisador foi à América do Norte com o propósito de analisar a relação entre a saúde e o conceito de capital social, que diz respeito às “normas e redes de confiança, solidariedade e cooperação, que permitem uma atuação conjunta e efetiva na busca de objetivos comuns”. Como resultado, concluiu que essa relação pode ajudar a entender porque as desigualdades em saúde se manifestam e como elas podem ser enfrentadas, com justiça social e solidariedade.

“Um número expressivo e crescente de pesquisas sugere que sociedades com níveis elevados de capital social possuem menos doenças, vivem mais, cuidam melhor de sua saúde, são menos violentas, menos desiguais e possuem melhor qualidade de vida.”

Marcos Patussi, pesquisador

Confira, a seguir, mais sobre o estudo e a experiência no exterior.

Como surgiu a vontade de fazer um pós-doc?

Marcos: Um dos principais motivos foi aprimorar e aprofundar o conhecimento em epidemiologia social, particularmente nos projetos que tenho desenvolvido com relação à aplicação do conceito capital social em pesquisas vinculadas à saúde. Este conceito é sociologicamente definido como “as normas e redes de confiança, solidariedade e cooperação, que permitem uma atuação conjunta e efetiva na busca de objetivos comuns”. Outros incluem o estabelecimento de relações, troca de experiências e de conhecimento visando futuras parcerias no nível da pós-graduação em saúde coletiva.

Por que a escolha pelos Estados Unidos e pela Harvard School of Public Health (HSPH)?

Marcos: A Universidade de Harvard destaca-se como centro de excelência mundial em pesquisas científicas, incluindo as relacionadas à saúde pública através da HSPH. Também contribuiu a presença do professor Kawachi, um pesquisador internacionalmente reconhecido, que possui mais de 400 artigos científicos publicados a respeito dos determinantes sociais e econômicos da saúde de indivíduos e grupos. A leitura de um de seus livros, “Social capital and health”, me instigou a um dia conhecê-lo.

Qual o tema de sua pesquisa de pós-doutorado?

Marcos: O objetivo foi investigar a relação entre o capital social e a saúde. Um número expressivo e crescente de pesquisas sugere que sociedades com níveis elevados de capital social possuem menos doenças, vivem mais, cuidam melhor de sua saúde, são menos violentas, menos desiguais e possuem melhor qualidade de vida.

Isso se daria devido ao fato de o capital social exercer seus efeitos através de várias maneiras, tais como: influenciando e facilitando a formação e difusão de informações e comportamentos favoráveis à saúde, promovendo uma maior conscientização da população sobre seus direitos e deveres e, por conseguinte, um maior acesso e uso dos serviços de saúde, estimulando processos psicossociais, os quais promoveriam maior apoio emocional, autoestima e redução do stress, e atuando via processos políticos, produzindo uma participação política mais igualitária, que resultaria em políticas públicas mais eficazes e menores desigualdades sociais.

Ou seja, o capital social de um indivíduo ou comunidade poderia contribuir, direta ou indiretamente, para a melhoria da saúde de indivíduos e grupos, bem como do setor da saúde como um todo. Finalmente, trata-se de um tema interessante, que oferece uma maneira nova e excitante de revitalizar as pesquisas em saúde coletiva, pois fornece espaço para uma abordagem não-individualizada, que rompe barreiras disciplinares.

Quais as principais contribuições de sua pesquisa?

Marcos: Não há relatos de estudos brasileiros que investiguem esta associação utilizando-se de estudos prospectivos. Este projeto se propôs a estudar esta relação em uma cidade brasileira, São Leopoldo, adotando um estudo de delineamento prospectivo. Além disso, um dos principais achados de nossa pesquisa demonstrou uma forte associação entre mortalidade e ação social. Menores taxas de mortalidade foram encontradas em bairros com maior ação social. Ou seja, os resultados sugerem que as pessoas vivem por mais tempo em localidades onde são mais ativas socialmente, especialmente para resolverem os problemas locais de sua comunidade/vizinhança. Este é um resultado ainda não relatado na literatura sobre o tema e que oferece uma oportunidade única para melhor entender porque as desigualdades em saúde se manifestam e como elas podem ser mais bem enfrentadas, com justiça social e solidariedade.

Culturalmente, o que o país tem em comum com o Brasil e em que é diferente?

Marcos: Os comentários a seguir são baseados apenas em impressões pessoais, restritas, e, portanto provavelmente não generalizáveis. Talvez as similaridades se restrinjam à extensão geográfica. Quanto às diferenças, algo que me deixou bastante impressionado é como, de uma maneira geral, os serviços de atendimento, públicos e privados, são planejados e organizados. São objetivos, efetivos, e funcionam de forma a facilitar e simplificar a vida dos cidadãos. Muito se resolve com apenas um telefonema ou email.

A questão da inovação e tecnologia também se encontra a uma distância considerável a frente do Brasil, onde temos muito a aprender e desenvolver. Apesar do individualismo, também existe um senso de confiança grande entre os norte-americanos. O pressuposto básico é o de que todos falam a verdade, até prova em contrário. O “jeitinho brasileiro” é exceção. Onde vivemos, em Boston, o senso de segurança na vizinhança é elevado. As pessoas não pegam o que não é seu, se esqueceres o casaco na praça, provavelmente o encontrarás no outro dia, no mesmo lugar. Condutas não idôneas também são rapidamente e veementemente punidas.

Por outro lado, tenho impressão de que o povo brasileiro é mais acolhedor, mais alegre, menos consumista. As pessoas no Brasil trabalham mais em equipe, são mais abertas, se ajudam mais. Parece que para nós, brasileiros, mazelas do mundo contemporâneo possuem uma solução, há uma luz no fim do túnel, há uma solução pacífica, diplomática.

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