Refletindo sobre produção musical

Quinta edição do Congresso internacional Comusica é realizada na Unisinos

Crédito: Janaína Costa

Ainda faltam cinco dias para começar as aulas da graduação na Unisinos, mas os alunos de pós-graduação já retornaram às atividades após o período de férias. Nessa terça-feira, 01/08, a Universidade, por meio do PPG em Comunicação e do grupo de pesquisa Cult POP, sediou o congresso Comusica. Palestrantes de diferentes partes do Brasil, inclusive do exterior, vieram compartilhar suas pesquisas, percepções e experiências acerca do universo musical. O congresso visa discutir temas relacionados às cenas musicais, transformações na indústria da música, sua relação com as cidades e de que forma a criatividade tem sido tensionada e discutida criticamente nos últimos anos nas pesquisas em comunicação e música. Abriram o evento o coordenador do PPG em Comunicação, Gustavo Fischer, a coordenadora do GP Cult POP, Adriana Amaral, e a professora Simone de Sá, da UFRJ.

As fronteiras da cena underground

A palestra de abertura do evento foi feita pela socióloga, pesquisadora e professora da Faculdade de Artes e Humanidades da Universidade do Porto, Paula Guerra. Com o impactante título “Live fast and die Punk” (do inglês: Viva rápido e morra Punk), a lusitana discorreu sobre a múltipla ancoragem da cena musical contemporânea do Punk em Portugal. Na singularidade do gênero, a pesquisadora reflete sobre os paradigmas acerca da cultura musical juvenil, a relação entre a origem e a experiência social dos jovens e a forma como se organizam nas suas identidades e estilos de vida.

“Em Portugal, essa microestrutura de poder e esse “capital subcultural” não são centrados e determinados pela classe. Pelo contrário, as distinções de capital subcultural podem ofuscar as diferenças de classes. Além disso, a subcultura não pode ser reduzida à condição juvenil”, pontua. Segundo Paula, a pluralidade das posições assumidas dentro da cena, em Portugal, estão associadas à dinâmica das cenas musicais, sobretudo às cenas punk, que partilham uma particular filosofia. Trata-se também de uma tensão decorrente da pequenez e marginalidade da cena, o que obriga ao desempenho de múltiplas funções ao longo do trajeto de vida.

O que se percebe, segundo Paula, é que a natureza da participação da cena varia de acordo com a idade e independe da classe social, o que se mostra diferente de outros países. É possível dizer que, em Portugal, existe continuidade e renovação geracional do gênero.  “O punk está longe de ser um assunto de história”, assinala.

O cenário musical gaúcho

Antes da palestra de abertura, os alunos participaram de um bate-papo com Léo Felipe (Galeria Ecarta), Dejeane Arruee (As Batucas), Caco Spector (Bugio discos), diferentes protagonistas da música e das artes visuais.  A discussão foi acerca do papel da música nas indústrias criativas em Porto Alegre. A mediação foi do professor e coordenador do curso de Produção Fonográfica, Frank Jorge.

Com contribuições plurais, Caco Spector iniciou o bate-papo falando sobre o crescente mercado do vinil e de como o consumo musical vem sendo resgatado por meio dessa prática. Além disso, fala sobre a descentralização dos espaços de produção e consumo musical, defendendo projetos de povoar a cidade para o incentivo do crescimento de bandas locais. “A rua é um lugar livre para os artistas mostrarem seu trabalho”, argumenta. Segundo ele, escutar música pela internet e escutá-la na rua são experiências diferentes. “O mundo analógico permite contato com a produção”, defende.

Caco legitima a necessidade de serem proporcionadas oportunidades para a recriação da cena musical gaúcha e do desenvolvimento de uma economia criativa. Segundo ele, ser empreendedor cultural exige coragem e força de vontade, em um país que, predominantemente, vira as costas para a cultura local, e onde ainda há muita carência de produto de qualidade. “Mas não desistam de produzir cultura”, aconselha.

Dejeane Arruee traz a experiência da Batucas – Orquestra feminina de bateria e percussão, da qual faz parte. Uma iniciativa que nasceu com o intuito de desmistificar a ideia de que a cena musical é um local exclusivamente masculino. A Batucas consolidou um espaço para a visibilidade e para o protagonismo da mulher na música. O grupo, formado exclusivamente por mulheres, de todas as idades, entre experientes e amadoras. “Eu vivo nesse meio há muito tempo. Já toquei em outras bandas. Mas é a primeira vez que toco com mulheres ao meu lado”, revela. A música pela Educação e a ocupação de espaços públicos para o fazer musical são as principais contribuições dos artistas, na opinião de Dejeane.

Na opinião de Leonardo Cevallos, a atual geração sofre com o silêncio e a reclusão a espaços privados do movimento grunge pós-ditadura, e com a privatização do espaço público, por isso, é perceptível que é uma geração quer ir para a rua. Uma voz que quer falar do coletivo.  “Especialistas dizem que a música do futuro vai ser aquela que vêm para questionar o gênero musical e aquela que for um caminho para a propagação de ideologias e ruptura de padrões”, salienta.

Diante de diversas cenas musicais, Frank Jorge complementa que a internet permitiu que as novas bandas ganhassem espaço de reprodução. “Antes, nós estávamos acostumados a ouvir música pelos meios tradicionais (rádio e TV) e sempre as mesmas bandas”, avalia. Além disso, pondera que mudou também a forma como o músico percebe o seu papel. Muito além da recorrente expressão de ser “apenas músico”, a categoria tem-se preocupado com a formação multifacetada, com a abrangência e relevância de seu conteúdo, e com novas formas de interação com a sociedade. “Esse novo caminho, para muitos artistas, é muito interessante”, conclui.

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